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Tem sido muito comentado o fato de que a economia americana caminha para uma recessão, algo que, a julgar pelo noticiário econômico parece que dado como certo. Certo ou não, é um fato que vivemos um cenário de desaceleração, inflação, aumento de juros aqui nos EUA, e que isso cria essa expectativa nos agentes. Uma pesquisa recente do Deutsche Bank mostra que 88% dos investidores institucionais veem uma recessão acontecendo ainda em 2022 ou em 2023 e a queda do S&P 500 no ano indica que o mercado já pode ter feito a sua aposta.

Mas e o que se passam com as empresas e o que elas nos dizem?

A julgar pelo comentário de Jamie Dimon, CEO do maior banco dos EUA, os bancos estariam pessimistas com o que há de vir:

“The economy continues to grow and both the job market and consumer spending, and their ability to spend, remain healthy.(…) But geopolitical tension, high inflation, waning consumer confidence, the uncertainty about how high rates have to go and the never-before-seen quantitative tightening and their effects on global liquidity, combined with the war in Ukraine and its harmful effect on global energy and food prices are very likely to have negative consequences on the global economy sometime down the road.”

Mas apesar da visão negativo de Dimon, um olhar sobre os resultados dos maiores bancos dos EUA, divulgados nas últimas semanas, não me trouxeram essa mesma perspectiva. Bem verdade que houve reduções nos lucros ante o 2T21, mas ainda assim alguns fatores sustentam essa minha percepção.

Aqui cabe um parêntese: os bancos, por serem o coração de um sistema capitalista, podem nos trazer insights interessantes a medida em que nos fornecem uma fotografia do crédito, inadimplência, investimentos etc. O desaquecimento do crédito indicaria menos investimento e crescimento futuros e os aumentos de inadimplência mostram que os consumidores e empresas já estão percebendo dificuldades de fluxo de caixa. Mais especificamente, o modus operandi da contabilidade bancária exige que os bancos se preparem previamente para momentos adversos de aumento de inadimplência que ocorrem em cenários de recessão. Por isso, os resultados dos bancos são tão importantes.

Feito esse parêntese diria que vimos 3 grandes tendências nos resultados recentes dos bancos americanos:

(i) Queda de 49% em média na comparação anual das receitas do segmento de Investment banking (banco de investimento) dos seguintes bancos: JP Morgan, Bank of America, Morgan Stanley, Goldman Sachse o Citigroup (os 5 maiores bancos dos EUA em termos de valor de mercado),
(ii) O aumento das taxas de juros tem sido benéfico para os bancos.
(iii) O crédito seguiu se expandindo e sem deterioração de carteira.

Sobre o primeiro item não quero me estender, pois esses representam menos a main street e mais Wall Street, ou seja, talvez não sejam uma boa fotografia do que se passa em toda a economia americana em seu “ground level”. A queda de IPOs no ano (fonte) e o menor número de emissão e estruturações de dívida (fonte) podem explicar as quedas de lucros. O Goldman Sachs, que opera essencialmente um banco de investimentos, viu seu lucro decrescer 48% na comparação anual. A redução dos preços dos ativos pesou sobre o resultado do Morgan Stanley, o qual tem 44% da receita (fonte) derivada da sua área de Wealth Management, e o seu braço de banco de investimento percebeu queda da receita de 55%. Essa mesma tendência foi vista nos braços de banco de investimento do Citi e Bank of America. No entanto, penso que esses resultados não refletem necessariamente um cenário de desaceleração ou recessão, pois são mais pontuais e restritos a operações específicas do mercado de capitais.

Falando rapidamente sobre o segundo ponto. Um fator fundamental para os bancos é a questão do seu spread, ou seja, o quanto eles cobram por um empréstimo vis a vis ao valor que remuneram depósitos. Em tese, taxas de juros mais altas dão maior flexibilidade aos bancos, que conseguem melhorar esse spread. De fato, isso é o que vimos nesse segundo trimestre. O CEO do Bank of America resume bem:

“This solid client activity across our businesses, coupled with higher interest rates, drove strong net interest income growth and allowed us to perform well in a weakened capital markets environment.”

E, segundo Gerard Cassidy, chefe de mercado de capitais da RBC:

“O aumento das taxas de juros de curto prazo tem sido muito benéfico para os bancos. Você viu isso com os números do Bank of America, onde sua margem de juros líquida e receita de juros líquida cresceram substancialmente em relação a um ano atrás.”

Em geral os bancos se beneficiaram do cenário reportando Net Interest Income (receitas liquidas com juros ou spread) maiores, o que em parte compensou quedas em braços de investimento ou elevação de provisões para potenciais perdas em créditos – abaixo comento mais.

Mas é o ponto 3 que a meu ver merece destaque, pois ali temos o coração do banco, que é sua operação de crédito. Voltando um pouco no tempo, em 2021 os bancos experimentaram uma expansão de crédito com o retorno do consumo das famílias e empresas reforçando estoques e expandindo operações. Seria normal desacelerar. Ainda assim, 2 dos maiores “emprestadores” do mercado americano, o JP Morgan e Wells Fargo, viram suas carteiras de empréstimos crescerem 7% e 8,4%, respectivamente. E no JP a despeito do prognóstico negativo do CEO, durante as teleconferências de resultados, executivos do banco disseram que esperam crescimento de empréstimos de “1 dígito alto” (algo acima de 7%).

Abrindo os resultados, foi possível ver a continuidade de expansão de crédito corporativo. Talvez com mercado de capitais mais “nervosos”, as empresas retornaram aos bancos como forma de levantar funding para suas operações. O JPMorgan, por exemplo, viu 6% de crescimento em empréstimos corporativos e industriais. O Citigroup disse que os empréstimos para clientes institucionais cresceram 3%. A CEO do banco, Jane Fraser, disse:

“We are seeing an increase of lending as our clients have been less inclined to obtain financing through the debt markets given the recent swings.”

Mas de fato foi o consumo e o consumidor que ajudaram a roda a girar. Se por um lado já foram vistos sinais de queda em empréstimos hipotecários, com o aumento das taxas de juros aqui nos EUA, por outro os empréstimos com cartão de crédito aumentaram, com JPMorgan e Wells Fargo relatando um salto de 17% (fonte). O Citi deu destaque para os gastos com cartão de crédito, que dentre os clientes de varejo aumentaram 11% na comparação anual – veja no slide 13. No Bank Of America os gastos através do cartão foram da ordem de 10% (slide 15) e a carteira total de empréstimos ao consumidor se expandiu 8% (slide 9).

Então em linhas gerais, podemos dizer que vimos a continuidade da expansão do crédito. O crédito seguiu fluindo na economia. Até aqui, mesmo com taxas mais altas seguimos vendo um sistema irrigado e fluindo.

Com mais créditos, aumentam-se as provisões. O JP Morgan provisionou US$428 milhões para empréstimos que possam gerar problemas, o Bank of America US$523 milhões, o Wells Fargo separou US$580 milhões e o Citi US$424 milhões. Esse aumento de provisões é normal, é parte da vida do banco e reflete 2 coisas: crescimento da carteira, o qual requer por regulação um provisionamento, e sua visão acerca de futuro e potenciais calotes. Mas a julgar pelos tamanhos das provisões, comparativamente aos tamanhos de carteira de crédito, pode-se dizer que as provisões não se relacionam ao cenário dantesco de recessão profunda. Para fins de comparação, o Citibank provisionou quase US$10 bilhões (slide 3) em 2020 e o Bank of America, por exemplo, US$7,2 bilhões (slide 2).

A inadimplência seguiu relativamente “comportada”. No Citi, os empréstimos com atrasos até se reduziram, saindo de 3,09% no 2T21 para 2,60% agora nesse trimestre (slide 22) – ainda que tenham aumentado frente o 1T22. No Bank of America também não se viu aumento de inadimplência, com o banco escrevendo eu seu report de resultados: a inadimplência de dívidas em estágio final no cartão crédito permanece próxima as mínimos de vários anos. (slide 24)

Olhando a frente
Nem tudo são flores e obviamente existem preocupações olhando a frente, mas em geral ao ler ou ouvir as transcrições das conferências de resultados dos bancos não observei grandes preocupações. O CFO do Morgan Stanley, Sharon Yeshaya pontua:

“We really have not seen yet any major cracks as it relates to the health of the consumer,” said Leon “Credit quality is still very good but that will probably shakeout sometime next year.”

O CEO do Bank of America finalizou o call dizendo ser importante conversar sobre a possibilidade de recessão e seus impactos, mas que não tem visto desaceleração relevante na sua base de clientes (slide 19). Respondendo a uma pergunta acerca do tamanho do provisionamento que fizeram, ele disse que nos cenários que o banco traça eles incorporam a possibilidade de aumento de desemprego, mas que mesmo assim se sente confortável com o provisionamento feito até agora.

O Wells Fargo comenta em seu release de resultado que acredita sim que as perdas com empréstimos e operações de crédito devem aumentar, dado que estão em patamares “incrivelmente baixos”, mas que ainda não observaram nenhuma deterioração significativa sua carteira de crédito (slide 1).

Ainda assim, o que chamou atenção foi o fato do Citibank e JP Morgan congelaram suas recompras de ações e que mantiveram seus dividendos inalterados, ao passo que outros bancos elevaram o pagamento aos acionistas. Seriam esses fatores conservadorismo ou preocupação que levam a uma busca por preservação de capital?

Essa pode ser uma visão míope, incompleta ou ainda prematura, mas a julgar pelo que li a respeito dos resultados os bancos não parecem tão pessimistas assim com o futuro da economia americana. Eles se preparam para um cenário de menor crescimento fazendo suas provisões, assim como devem fazer, mas não parecem traçar um cenário catastrófico. Será que o mercado estaria exagerando novamente?

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Aquele abraço, William Castro Alves

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